Distrato de contrato de promessa de compra e venda de imóvel

Discussão em 'Direito Civil, Empresarial e do Consumidor' iniciado por RAFAEL NATHAM XAVIER LIMA, 18 de Junho de 2018.

  1. RAFAEL NATHAM XAVIER LIMA

    RAFAEL NATHAM XAVIER LIMA Membro Pleno

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    Boa tarde Dr(a)

    Tenho uma dúvida.
    Fui procurado por uma cliente que comprou um apartamento na planta, pagou 40 mil de entrada dividido em parcelas e ao realizar o distrato, a construtora reteve á título de multa 25% do valor + 3% do valor total do apartamento como comissão do corretor do imóvel, restituindo a minha cliente em 6 parcelas.

    Meu questionamento é?
    Após realizado o distrato, entro com qual procedimento para rever essas cláusulas abusivas do distrato. Cabem danos morais?
  2. Beto Lino

    Beto Lino Membro Pleno

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    Boa noite, Dr. Rafael.

    Entendo que pode ser cabível, no caso, o ajuizamento de ação de repetição de indébito cumulada com pedido de reparação de dano moral em face da construtora/incorporadora.

    O STJ possui jurisprudência pacífica no sentido de que, em caso de resolução do contrato de promessa de compra e venda de imóvel submetido ao CDC (vendedor exercendo a atividade de comercialização de imóveis de maneira habitual e comprador sendo o destinatário final do bem adquirido), a restituição dos valores pagos deve ocorrer de forma imediata. Segue entendimento sumulado:

    Súmula nº 543 - Na hipótese de resolução de contrato de promessa de compra e venda de imóvel submetido ao Código de Defesa do Consumidor, deve ocorrer a imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador - integralmente, em caso de culpa exclusiva do promitente vendedor/construtor, ou parcialmente, caso tenha sido o comprador quem deu causa ao desfazimento. (Súmula 543, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 26/08/2015, DJe 31/08/2015)​

    Perceba que a restituição em seis parcelas contraria frontalmente a pacífica jurisprudência do STJ, de modo que, ante a abusividade da conduta da construtora/incorporadora e sua situação de superioridade econômica em relação à adquirente do imóvel, ao menos em tese haveria alguma chance de êxito quanto ao pleito de reparação do dano moral. De qualquer forma, sugiro consultar a jurisprudência do Tribunal local quanto a essa questão.

    Caso o desfazimento do negócio tenha decorrido de culpa da adquirente, o que parece ter ocorrido no caso em tela, caberia a retenção de parte do valor efetivamente pago até a data da inequívoca manifestação de vontade quanto à resolução do contrato.

    Nesse contexto, o STJ tem se manifestado no sentido de que o percentual retido deve corresponder a algo entre 10% e 25% do valor das parcelas quitadas (não do valor do imóvel!). Segue precedente:

    AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. [...]. RETENÇÃO DE PERCENTUAL DOS VALORES PAGOS EM CASO DE RESOLUÇÃO CONTRATUAL POR CULPA DO COMPRADOR. SÚMULAS 7 E 83 DO STJ. AGRAVO INTERNO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA EXTENSÃO, DESPROVIDO. [...]. 2. A jurisprudência desta Corte Superior está orientada no sentido de permitir a retenção no percentual entre 10% e 25% dos valores pagos quando houver resolução do compromisso de compra e venda por culpa do compromitente comprador, bem como proibir a revisão do valor estabelecido nesta circunstância, por implicar reexame fático-probatório. Caso concreto no qual a multa contratualmente estabelecida para a supracitada hipótese foi reduzida pelo Tribunal de origem para 20% dos valores pagos, com base na suficiência reparatória do montante arbitrado. 3. Agravo interno parcialmente conhecido e, nessa extensão, desprovido. (AgInt no AREsp 1140299/SP, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Terceira Turma, j. 5/12/2017, DJe 19/12/2017)​

    No caso específico da sua cliente, penso ser importante pesquisar a jurisprudência do Tribunal competente para julgar a lide. Caso o percentual comumente definido pelo Poder Judiciário local seja inferior aos 25% aplicados pela construtora/incorporadora, mas igual ou superior ao “piso” de 10%, haverá boas chances de êxito, uma vez que dificilmente o percentual fixado pelas instâncias ordinárias será revisado em sede de eventual Recurso Especial caso esteja situado dentro dos limites já estipulados pelo STJ.

    Outro fator importante a ser avaliado é o momento em que ocorreu a resolução do contrato: quanto maior a antecedência em relação à conclusão das obras (ou entrega das chaves), menor (ou seja, mais distante de 25% e mais próximo de 10%) ficará o percentual a ser retido pela incorporadora. Isso deve ser aferido no caso concreto.

    Por fim, quanto à comissão de corretagem, de acordo com jurisprudência firmada recentemente pelo STJ, caso o valor cobrado a esse título tenha constado de forma clara/expressa/destacada em contrato previamente apresentado pela construtora/incorporadora, a obrigação de pagar pode ser repassada à promitente compradora (Recursos Repetitivos – Tema 938 – REsp 1.599.511). Nesse caso, havendo arrependimento de uma das partes, não haveria que se falar em devolução do valor cobrado, nos termos do artigo 725 do vigente Código Civil. Some-se a isso o fato de que o percentual da comissão de corretagem no caso em tela (3%) não se mostra abusivo, estando coerente com as atuais práticas de mercado, o que autorizaria a retenção pela construtora/incorporadora.

    Importante, aqui, ressaltar que o STJ diferencia desistência (contrato ainda em negociação) de arrependimento (contrato já celebrado), conforme teor do acórdão proferido no julgamento do REsp 1183324 SP (Relatora: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 18/10/2011, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 10/11/2011). Pelo que pude inferir, no caso concreto da sua cliente o contrato de promessa de compra e venda já havia sido celebrado, tratando-se, portanto, de arrependimento, o que permitiria a retenção da comissão de corretagem pela construtora/incorporadora.

    É como penso, mas sugiro aguardar a manifestação de outros colegas.
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