Descanso De 15 Minutos Para Mulheres: Prevalece Entendimento De Recepção Pela Cf Ao Art. 384 Da Clt

Discussão em 'Direito do Trabalho' iniciado por Ribeiro Júnior, 08 de Abril de 2010.

  1. Ribeiro Júnior

    Ribeiro Júnior Membro Pleno

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    A Seção I Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho (SDI-1) decidiu por unanimidade, manter o posicionamento adotado pela Segunda Turma que condenou a Copel Distribuição S.A. ao pagamento de horas extraordinárias por não conceder o intervalo (descanso) de 15 minutos à funcionária que trabalhou em sobrejornada (prorrogação do horário).

    A Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho condenou a empresa ao pagamento de horas extras pela não observação da obrigatoriedade da concessão do intervalo no caso de trabalho em jornada extraordinária, conforme disposto no artigo 384 da CLT. A empresa recorreu da condenação à SDI-1 sob a alegação de que a Constituição Federal de 1988 não havia recepcionado o artigo citado, não sendo devidas, portanto, as horas extraordinárias.

    A relatora, ministra Maria Cristina Peduzzi, observou que o caso “não comporta mais discussão no TST”, pois a SDI-1 já tem entendimento pacificado no sentido de que o artigo 384 da CLT foi recepcionado pela Constituição Federal, portanto, no caso, a sentença da Segunda Turma não merece reforma, sendo devidas horas extras decorrentes da não observância do intervalo de 15 minutos para a mulher antes do trabalho em sobrejornada acrescido do adicional de 50%.

    Breve histórico

    Segundo o artigo 5º, inciso I, da Constituição Federal, homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações. Porém o artigo 384 da CLT ensina que, em caso de prorrogação do horário normal, será obrigatório um descanso de 15 (quinze) minutos, no mínimo, antes do início do período extraordinário do trabalho, diferenciando mulheres e homens.

    Esta diferenciação, durante muito tempo, foi motivo de discussões no TST, observou a relatora Maria Cristina Peduzzi. De um lado, teses que defendiam a recepção do artigo 384 da CLT pela CF/88, entendendo não haver discriminação entre os sexos ao conceder o intervalo de 15 minutos; de outro, havia o entendimento da não recepção pela CF/88 do referido artigo, sob o argumento que o intervalo teria cunho discriminatório.

    A discussão no TST gerou o incidente de inconstitucionalidade IIN-R-1540/2005-046-12-00.5, julgado no dia 17 de dezembro de 2008. Nesta data a SDI-1 pacificou entendimento de que houve pela CF/88 a recepção do artigo 384 da CLT, não se constituindo, portanto, discriminação ao conceder à mulher o intervalo de 15 minutos. O relator do incidente à época, ministro Ives Gandra Martins Filho, ao rejeitar a tese da não recepção, lembrou que as mulheres que trabalham fora estão sujeitas à dupla jornada (trabalho e casa) e que o texto constitucional já havia concedido à mulher diferentes condições de aposentadoria (idade e tempo de serviço). (RR-46500-41.2003.5.09.0068)


    FONTE: Tribunal Superior do Trabalho, em http://www.iob.com.br/noticiadb.asp?area=juridicas&noticia=154049
  2. Ribeiro Júnior

    Ribeiro Júnior Membro Pleno

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    Particularmente, discordo do TST.

    O art. 384 da CLT não foi recepcionado pela Carta Magna de 1988. Tal afirmação torna-se clara ao analisar-se o art. 5º, I, desta, pois há nele a expressão máxima do Princípio da Isonomia. No mesmo sentido, o art. 7º, XXX, reitera o citado princípio no âmbito laboral.

    Por não terem sido recepcionadas, as normas discriminatórias anteriores a CF/88 encontram-se revogadas tacitamente, e, não apenas, guardam caráter inconstitucional. Assim decidiu o Supremo Tribunal Federal, na ADIn 521-9-DF, rel. Min. Paulo Brossard, que disse: “A Constituição sobrevinda não torna inconstitucionais leis anteriores com ela conflitantes: revoga-as”.

    Ao conceder a homens e mulheres os mesmos direitos e obrigações, o constituinte atingiu todas as normas discriminatórias. Observe-se que o art 384 da CLT não traz nenhuma razão material para distinguir o tratamento dado à mulher e ao homem na concessão de descanso antes do início da jornada por hora extra. O referido artigo celetista é um resquício de um período histórico em que era preciso a proteção e tutela dos interesses da obreira: o mesmo faz parte da redação original do Decreto-Lei 5.452 de 1º de maio de 1943. Foi um momento de evolução social no qual fez-se necessária a criação de normas protetivas que tinham como escopo resguardar a saúde, a segurança e a higidez física das mulheres.

    É notório que hodiernamente as mulheres encontram-se em posição muito mais favorável àquela que enfrentavam à época da publicação da CLT. Inclusive, o constituinte de 88 aboliu todas as discriminações ao dar posição privilegiada ao Princípio da Isonomia, trazido expressamente em dois momentos (art. 5º, I, e art. 7º, XXX). Assim, faz-se inócua a suposta proteção trazida pela CLT às mulheres. No ano seguinte ao da promulgação da Carta Democrática, uma Medida Provisória, que posteriormente foi convertida na Lei 7.855/89, foi editada, revogando diversos artigos do Capitulo III da CLT, referente à proteção do trabalho da mulher. Este movimento veio corroborar a intenção de extinguir as diferenças desnecessárias no tratamento ao labor de homens e mulheres. Neste sentido a ilustre professora e magistrada Alice Monteiro de Barros:


    "Considerando que é um dever do estudioso do direito contribuir para o desenvolvimento de uma normativa que esteja em harmonia com a realidade social, propomos a revogação expressa do artigo 376 da CLT, por traduzir um obstáculo legal que impede o acesso igualitário da mulher no mercado de trabalho. Em conseqüência, deverá também ser revogado o artigo 384 da CLT, que prevê descanso especial para a mulher, na hipótese de prorrogação de jornada. Ambos os dispositivos conflitam com os artigos 5º, I, e artigo 7º, XXX, da Constituição Federal." BARROS, Alice Monteiro de. A Mulher e o Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 1995. p. 478.


    Por mais, a norma do art. 384 da CLT, caso tivesse sido recepcionada pela CF/88, seria um instrumento de desestímulo à contratação da mulher, porque seria mais oneroso que a contratação de homens. Tal entendimento também é compartilhado pelo douto professor Sérgio Pinto Martins:


    "O preceito em comentário conflita com o inciso I do artigo 5º da Constituição, em que homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações. Não há tal descanso para o homem. Quanto à mulher, tal preceito mostra-se discriminatório, pois o empregador pode preferir a contratação de homens, em vez de mulheres, para o caso de prorrogação do horário normal, pois não precisará conceder o intervalo de 15 minutos para prorrogar a jornada de trabalho da mulher." MARTINS, Sergio Pinto. Direito do Trabalho. 13ª ed. São Paulo: Atlas, 2001. p. 69.


    Devem, portanto, ser mantidas as normas protetivas à mulher apenas quando tiverem por fundamento distinções biossociais, e não meramente culturais. Exempli gratia, as garantias referentes à maternidade, ao esforço físico, ao decurso de tempo para pleitear aposentadoria (por idade ou tempo de contribuição), dentre outras condições especiais. Assim julgou o TRT da 9ª Região – Paraná:


    "quanto à não concessão do intervalo previsto no artigo 384 da CLT, entendo que, por não importar em acréscimo de jornada, configura mera infração administrativa. Além do mais, o dispositivo trata de proteção do trabalho da mulher, o qual se encontra revogado em face das disposições constitucionais que asseguram igualdade de direitos e deveres entre homem e mulher. A meu juízo, impossível a manutenção de qualquer norma de proteção, salvo aquelas que se referem a condições especiais da condição da mulher, como a maternidade e o deslocamento de peso. Ante o exposto, reformo o julgado para excluir a condenação ao pagamento de 15 minutos extraordinários e reflexos baseados no artigo 384 da CLT". Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região. Volume 24. Nº 1. Janeiro a junho de 1999. p. 241, Proc. TRT-PR-RO 15.798/98, Acórdão 4ª T. 16.250/99, julgado em 26-05-99, publicado no DJPR de 23-07-99.


    Verifica-se, assim, que não frutifica o entendimento do C. TST, pois o direito ao descanso de 15 minutos, antes do início da jornada extraordinária, positivado no art. 384 da CLT, encontra-se tacitamente revogado, conforme aquilo que já foi posto acima, por não ter sido recepcionado pela Carta Democrática. Ademais, tal entendimento era repetido no Egrégio Tribunal Superior do Trabalho, em diversas turmas, além da Seção de Dissídios Individuais, conforme brilhante decisão, cuja ementa transcrevo abaixo:


    “RECURSO DE EMBARGOS. TRABALHO DA MULHER. INTERVALO PARA DESCANSO EM CASO DE PRORROGAÇÃO DO HORÁRIO NO R MAL. ARTIGO 384 DA CLT. NÃO RECEPÇÃO COM O PRINCÍPIO DA IGUALDADE ENTRE HOMENS E MULHERES. VIOLAÇÃO DO ART. 896 DA CLT RECONHECIDA. O art. 384 da CLT está inserido no capítulo que se destina à proteção do trabalho da mulher e contempla a concessão de quinze minutos de intervalo à mulher, no caso de prorrogação da jornada, antes de iniciar o trabalho extraordinário. O tratamento especial, previsto na legislação infraconstitucional não foi recepcionado pela Constituição Federal ao consagrar no inciso I do art. 5º, que homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações. A história da humanidade, e mesmo a do Brasil, é suficiente para reconhecer que a mulher foi expropriada de garantias que apenas eram dirigidas aos homens e é esse o contexto constitucional em que é inserida a regra. Os direitos e obrigações a que se igualam homens e mulheres apenas viabilizam a estipulação de jornada diferenciada quando houver necessidade da distinção, não podendo ser admitida a diferenciação apenas em razão do sexo, sob pena de se estimular discriminação no trabalho entre iguais, que apenas se viabiliza em razão de ordem biológica. As únicas normas que possibilitam dar tratamento diferenciado à mulher diz respeito àquelas traduzidas na proteção à maternidade, dando à mulher garantias desde a concepção, o que não é o caso, quando se examina apenas o intervalo previsto no art. 384 da CLT, para ser aplicado apenas à jornada de trabalho da mulher intervalo este em prorrogação de jornada, que não encontra distinção entre homem e mulher. Embargos conhecidos e providos.” Proc. TST E-RR – 3886/2000-071-09-00, Acórdão SDI-1, rel. Min. Aloysio Corrêa da Veiga, julgado em 31-03-2008, publicado no DJ de 25-04-2008.


    Assim, não merece prosperar o entendimento que reconhece o direito de intervalo de 15 minutos de descanso dado às mulheres antes do início da sobrejornada, por força do art. 384 da CLT, pois o mesmo não foi recepcionado pela CF/88, em homenagem ao Princípio da Isonomia entre os gêneros, positivados nos art. 5º, I, e 7º, XXX.
    Stealt e Fernando Zimmermann curtiram isso.
  3. Stealt

    Stealt Em análise

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    Grande Ribeiro! Desta vez, ouso discordar da sua nobre posição. Se não falha minha precária memória, creio que esse dispositivo da CLT (15 minutos) se aplica também ao trabalho do menor.

    Veja que o tema é bem polêmico, mas vejo que ele decorre não de questões relacionadas à igualdade (formal) prevista na Contituição, mas sim, exatamente, de distinção de natureza fisiológica.

    Observe que sempre que há uma desvantagem ou alguma exceção de cunho fisiológico, a Constituição e a CLT fazem essa disitinção. Observe o dispositivo da CLT que trata do trabalho com levantamento de cargas: para o menor e para a mulher, estabelece limites (20kg/25kg se não me engano), enquanto para os homens, estes entram no pacote "geral" de 60kg.

    Por mais que a Constituição tenha asteado essa bandeira da igualdade (como eu disse, meramente formal), deve-se levar em conta que as mulheres, em aspectos fisiologicos, são claramente mais frágeis. Logo, interpretando a Constituição e CLT sob o enfoque sistemático e teleológico, inexiste antinomia entre os dispositivos em questão - como se diz na doutrina: é apenas aparente.
    Ribeiro Júnior curtiu isso.
  4. Ribeiro Júnior

    Ribeiro Júnior Membro Pleno

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    Dr. Gustavo,


    Fico feliz em ser "discordado" por um colega brilhante como você. Seus argumentos são interessantes e quase me convenceram. Contudo, ainda perfilho da tese que tal discriminação atenta contra a isonomia constitucional. Observe que ou esta norma não deve valer para as mulheres, ou deve ser estendida (fiquei em dúvida se é com "s" ou com "x") aos homens. A sobrejornada será sempre sobrejornada. Imagine nas atividades meramente intelectuais, nas quais não há esforço físico, como dizer que o não fornecimento do intervalo antes da sobrejornada afeta a higidez da empregada e não afeta ao empregado?


    Att.,


    OBS.: Haja vista o início de debate sobre o tema, o tópico foi transferido para a seção correspondente.
  5. Stealt

    Stealt Em análise

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    Boa, essa observação sobre o trabalho intelectual é pertinente mesmo! Haveria sim uma isonomia. Assim, acho que a norma em questão foi recepcionada pela Constituição, com temperamentos. Vai de caso a caso. Mas e quanto ao menor? Acho que em matéria trabalhista há presunção absoluta de fragilidade e menor higidez física do menor. Nesse caso, acho que é aplicável totalmente o descanso, independente do tipo de trabalho. [​IMG]
  6. Ribeiro Júnior

    Ribeiro Júnior Membro Pleno

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    Ao menor? Não cheguei a pesquisar o que a CLT fala a respeito do intervalo antes da sobrejornada do menor (já que tal previsão não é feita no mesmo artigo). Mas entendo que o menor nem mesmo deveria prestar horas extras, pois há a presunção que seu tempo é dividido entre atividades educacionais e de lazer.


    Cordialmente,
  7. piccolli007@hotmail.com

    piccolli007@hotmail.com Advocacia Piccolli e Bordignon

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    Dr. Ribeiro Junior


    Concordo plenamente com seu posicionamento. Entendo que em se tratando de jornada extraordinária não há razão de ser a existência de diferenciação com relação ao sexo feminino. Essa proteção acaba por tornar-se uma discriminação com relação a mulher, que pode não ser contratada em virtude da maior onerosidade.

    Sou Advogada mas também sou bancária e cotidianamente realizo horas extras. Não consigo me imaginar cheia de serviço a fazer, descansando 15 minutos antes de iniciar a jornada extraordinária.

    Essa disposição celetista deveria ter sido revogada juntamente com as demais, pois pode ser uma norma válida e vigente, mas nada eficaz.

    Att.: Dra. Mariangela Piccoli
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