Furto Ou Apropriação Indébita?

Discussão em 'Direito Penal e Processo Penal' iniciado por darossa, 22 de Novembro de 2009.

  1. darossa

    darossa Em análise

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    Tenho um problema, alguém me ajuda? :)
    Ei-lo:

    Era uma vez uma empregada doméstica que trabalhava havia 20 anos na casa de sua patroa. Certo dia, sua empregadora lhe deu dinheiro para pagar o jardineiro, e a empregada o fez. Depois de feito, ela resolveu embolsar o troco, em vez de devolvê-lo à patroa.

    Responda: qual é o crime praticado pela doméstica, e diga se há uma qualificadora presente ou não.

    Minha resposta preliminar: furto praticado pela empregada contra a patroa, qualificado pelo abuso de confiança.

    Resposta oficial: apropriação indébita, caracterizada pela inversão do animus do agente (empregada), que recebeu de boa-fé o troco, mas depois resolveu retê-lo. Dessa forma não podemos falar em furto pois ela não subtraiu contrariamente à vontade do legítimo proprietário do dinheiro (a patroa).

    Pergunta: a própria professora, que nos apresentou esta questão, disse ser possível, desde que fundamentadamente, mostrar que também pode ter se tratado de furto. Como?? Ela disse que é um desafio.
  2. Ribeiro Júnior

    Ribeiro Júnior Membro Pleno

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    Estimado colega,


    Não sou penalista, aventuro-me nesta seara apenas para não enferrujar o raciocínio, mesmo assim é muito raro. Contudo, por tudo que já vivenciei e estudei nos idos tempos de academia, entendo que este seja um caso clássico de apropriação indébita. Pelo menos toda a doutrina que eu conheço e que pesquisei assim diz. De qualquer sorte, estarei conversando com colegas da área para informar-me melhor sobre esta hipótese. Qualquer novidade, reporte a nós.


    Att.,
  3. darossa

    darossa Em análise

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    Muito obrigado desde já pela presteza!

    Se possível, preciso da resposta até quarta-feira, 25 de novembro à noite, pois deverei levar durante a manhã da quinta! :)

    Obrigado de novo!
  4. Ismael

    Ismael Em análise

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    Pelo que vejo seria apropriação indébita

    Para se caracterizar o furto vc teria que comprovar que o dolo da agente.

    Pelo meu ver sua professora desafia vcs para ver a capacidade e criatividade em certas situações.
    No ramo da advocacia as vezes temos que defender teses que nem mesmo nós acreditamos que proliferem.

    Tente comprovar que foi furto e talvez vc ganhe até uns pontinhos com a professora
    uhauhaeuhaueah

    Garanto que ela deve estar mais interessada em ver a defesa de sua tese do que a própria tese.
    ^^
  5. gustavocastro

    gustavocastro Membro Pleno

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    No furto, há a subtração da coisa alheia móvel, sem que o sujeito passivo tenha consentido. Já na apropriação indébita, o sujeito ativo, aproveita-se da confiança do sujeito passivo que lhe transferiu a posse da "res" para assenhorar-se.

    A diferença está em:
    no furto, o S.A., subtrai, furta, retira o objeto da vítima sem o seu consentimento.
    na apropriação indébita, o S.A., recebe a posse do objeto da vítima e, logo depois, se apropria, fica, tem o animus de permanecer com tal objeto.

    www.priberam.pt/DLPO/Default.aspx




    senhorear - Conjugar
    v. tr.1. Tornar-se senhor de; conquistar.2. Dominar; reduzir.3. Captar o ânimo de.v. intr.4. Exercer domínio em.v. pron.5. Apossar-se; assenhorear-se.



    subtrair (a-í) - Conjugar
    (latim subtraho, -ere, tirar de baixo)
    v. tr.1. Tirar sem autorização; levar por astúcia ou fraude. = furtar, roubar, surripiar2. Retirar às escondidas ou com subtileza. = surripiar3. Afastar da vista ou do alcance. = esconder, livrar, ocultar, livrarv. tr. e intr.4. Aritm. Operar a subtracção!. = diminuir



    furtar
    v. tr.1. Subtrair fraudulentamente, sem violência.2. Apresentar como de própria lavra (o que é de lavra alheia).3. Desviar.4. Falsificar (imitando).

    Espero ter ajudado.
  6. bladoborges

    bladoborges Membro Pleno

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    Como já bem explicado pelos colegas..APROPRIAÇÃO INDÉBITA
  7. darossa

    darossa Em análise

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    Sim sim senhores, estou convencido de que se trata de apropriação indébita, inclusive explicitei isso no primeiro post, na parte "resposta oficial"! Tudo aponta mesmo para a apropriação indébita, como a confiança depositada no sujeito ativo (empregada) pela empregadora (sujeito passivo), como o Gustavo falou!

    O objetivo do desafio é: provar que o caso pode também se tratar de furto .

    Sim, a professora me pegou nessa. É de pôr pulgas atrás da orelha!
  8. IRON LAW

    IRON LAW Membro Pleno

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    Para mim, é furto.
    Mas, antes de qualquer comentário, entendo estar o enunciado mal elaborado. Não é verossímil que a patroa não soubesse quanto devia ao jardineiro, pois esse profissional estipula o preço do serviço antes de realizá-lo. Portanto, se a patroa sabia quanto deveria pagar, deu dinheiro a mais à empregada (sem definir o destino do troco) e não tocou mais no assunto, ela deu tacitamente a sobra à referida funcionária.

    Porém, suponhamos que o jardineiro tenha dado apenas uma ideia à patroa de quanto custaria o serviço. Esta, então, deu um valor que julgou suficiente à empregada e mandou-a pagar o jardineiro. Em relação a este valor (suponhamos, R$ 200,00), a empregada não tinha a menor intenção de fazer qualquer subtração. Após entregar o dinheiro ao jardineiro, a empregada surpreendeu-se ao receber, digamos, R$ 22,00 de troco e, no mesmo instante, resolveu tomá-lo para si. Ao ser indagada pela patroa sobre o referido troco, a empregada disse não haver nenhum.

    Vejamos um outro exemplo:
    A patroa manda seu motorista levar o carro para consertar. Ele leva o veículo sem a menor intenção de tomá-lo para si. Ao final do serviço,o mecânico informa ao motorista que, após o concerto, sobrou uma peça qualquer, ainda em bom estado. O motorista, imediatamente, pega a peça com a intenção de usá-la em seu próprio carro, nada informando à patroa.

    A meu ver, ambos os casos são de furto, pois, assim como a peça não se confunde com o carro, o troco não se confunde com os R$ 200,00.
  9. gustavocastro

    gustavocastro Membro Pleno

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    É um assunto que acaba indo bem longe, mas é isso que faz ter graça.


    Em resposta, IRON LAW, no caso dos 200 reais, que você expôs. Acredito, ainda na apropriação indébita, tendo em vista de a empregada ter a posse do dinheiro em favor de pagar o valor ao jardineiro. Se sobrou, ela tem de devolver, mas está com o dinheiro por confiança da patroa.

    Já no caso do motorista, a mesma coisa.
    Mas como a intenção é de se aferir o crime de furto, nesses casos, eles são cabíveis. Tudo depende da interpretação e da motivação.
  10. bladoborges

    bladoborges Membro Pleno

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    Caro Conterrâneo IRON.

    Você ainda confirma que é um caso de FURTO!

    O Dr. é advogado? se sim, atua na área Criminal?
  11. IRON LAW

    IRON LAW Membro Pleno

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    Você é do Rio?

    Sim.

    Não. Atuei apenas am caráter particular, sempre motivado pela ação de minha ex-mulher, que, inclusive, foi acusada de realizar uma apropriação indébita no condomínio em que era síndica.

    A questão não é confirmar ou deixar de confirmar, mas de apresentar argumentos que levem à interpretação defendida. Conforme entendo, a patroa entregou o pagamento do jardineiro à empregada, mas esta tomou para si o troco, ou seja, algo diverso do que lhe foi dado em confiança. No caso do motorista, o que lhe foi entregue pela patroa (e devidamente devolvido a ela) foi o carro. Ele subtraiu uma peça, não o automóvel. Portanto, eu defenderia a tese de furto sem problemas em um eventual processo com características semelhantes.
  12. JUS EST ARS

    JUS EST ARS Em análise

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    Era uma vez uma empregada doméstica que trabalhava havia 20 anos na casa de sua patroa. Certo dia, sua empregadora lhe deu dinheiro para pagar o jardineiro, e a empregada o fez. Depois de feito, ela resolveu embolsar o troco, em vez de devolvê-lo à patroa.




    Clássico exemplo de apropriação indébita.

    Apropriação indébita
    Art. 168. Apropriar-se de coisa alheia móvel, de que tem a posse ou a detenção:


    Furto
    Art. 155. Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel:

    A apropriação indébita pressupõe a posse do bem obtida justamente, ou seja, com o consentimento não viciado de quem de direito.

    O furto simples, de outro lado, exige posse obtida injustamente, o que não se deu em qualquer momento.

    Muito embora sua professora tenha dito que é possível caracterizar furto, não vejo malabarismo jurídico apto a chegar a tal conclusão.



    IRON LAW:

    Você descreve perfeitamente a conduta e elementares de apropriação indébita, mas conclui que se trata de furto, o que é incompreensível.

    Nos dois exemplos dados a posse do bem é obtida justamente, o que muda é o animus do agente. Ia devolver, mas depois resolve se apropriar.
  13. anthonyteen

    anthonyteen Futuro promotor

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    Pra mim é furto porque a empregada pega (furta) o troco sem o consentimento da patroa. Lendo os comentários dos colegas entendi que apropriação indébita aconteceria se a empregada pegasse o pagamento do jardineiro e não repassasse para ele ficando com o dinheiro.
  14. IRON LAW

    IRON LAW Membro Pleno

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    Exatamente. É essa a tese que venho defendendo. E você, por enquanto, foi a única a considerá-la válida.
  15. IRON LAW

    IRON LAW Membro Pleno

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    Exemplo do jardineiro:
    -Bem entregue para a empregada: pagamento do jardineiro (encaminhado a quem de direito conforme ordenou a patroa)
    -Bem subtraído pela empregada: troco

    Exemplo do mecânico:
    -Bem entregue para o motorista: carro (levado a conserto e devidamente devolvido à patroa)
    -Bem subtraído pelo motorista: peça ainda utilizável que sobrou do conserto

    Acho que devemos tomar cuidado ao adjetivarmos uma situação de “clássica”. Em determinado tópico, perguntei qual seria o juízo competente para a partilha de bens do casal posterior ao divórcio. Os foristas daqui, bem como o juiz e o MP que atuam no processo, foram unânimes ao dizer: Vara Cível. Eu insisti na tese de Vara de Família e o MP, após alguma discussão, passou a pensar o mesmo. E isso é apenas um exemplo de que determinadas situações “clássicas” nem sempre têm deslindes tão óbvios.
  16. bladoborges

    bladoborges Membro Pleno

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    Bacana Iron, sou carioca mas moro em SP.

    Bem, apesar de ser estudante ainda, ressalvado toda minha inexperiência e ignorância, o que não rebaixa meu grau intelectual e minha obsessão pela pesquisa científica e pelo Direito, não consigo elevar meu raciocínio ao ponto de considerar tal conduta como FURTO, face as diferenças nos dois tipos penais, já explicada com maestria pelos colegas.

    E com todo respeito ao colega PROMOTINHA, ela não furta o troco, ela ja teria o troco de qualquer forma, o delito não ocorre quando ela recebe o troco, mas quando desvia a direção, a finalidade, ou seja, o troco teria que ser entregue a dona e ela simplesmente desvia da finalidade e se apodera, como se don fosse, daquele troco.
  17. IRON LAW

    IRON LAW Membro Pleno

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    A partir do momento que a patroa deu o dinheiro à empregada, a quem ele pertencia? Ou seja, se a empregada resolvesse não pagar o jardineiro e embolsasse todo o dinheiro, quem seria a vítima do crime? A patroa, o jardineiro ou ambos?
  18. Fernando Zimmermann

    Fernando Zimmermann Administrador

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    Confira que não há dúvidas de que a empregada estava autorizada a pegar o troco; a não ser que alguém queira advogar que "a empregada somente deveria pagar, e a patroa a proibiu de pegar o troco", o que é algo bem inusitado de acontecer e praticamente indefensável.

    Desta forma, a empregada pega o troco com o consentimento da patroa (para lhe devolver). O que é a conduta ilícita não é pegar o troco (tanto que é esperado que a empregada o faça); mas sim se apoderar de tal montante, sem repassá-lo à patroa.

    Veja assim, que até o momento em que a empregada está com o troco em mãos não há que se falar em crime (se ela devolvesse à patroa tudo se daria de forma lícita). O crime só ocorre porque a empregada resolve agir de forma diversa do que estava autorizada a fazer (se apropria da quantia, não devolvendo à patroa).


    Logo, a posse de tal quantia se deu de forma justa; a ilicitude somente aconteceu com a não devolução; assim, o caso é de apropriação indébita.
  19. Ribeiro Júnior

    Ribeiro Júnior Membro Pleno

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    Como nunca tive vocação para ser MP, poderiamos falar em crime de bagatela? Ou melhor, na qualidade de causídico trabalhista, creio que pena maior é a aplicação da justa causa.

    Mas continuo a defender a apropriação indébita. Haja vista que o furto consuma-se com a posse mansa e pacífica do bem subtraído, e esta posse sempre ocorreu, de sorte que o bem foi apropriado ao patrimônio da agente criminosa e não subtraído da patroa para então ser possuído pela empregada.


    Att.,
  20. darossa

    darossa Em análise

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    Lendo os posts dos senhores, eu acho que matei a charada.
    Para que tal conduta seja caracterizada como furto, devemos pensar no montante do dinheiro (a quantia primeiramente entregue pela patroa à empregada, para que esta pagasse o jardineiro) como uma res diversa da do troco. Depois, temos que ter em mente que o troco não foi entregue livremente pela patroa à empregada e recebida de boa-fé por esta, mas sim foi entregue pelo jardineiro à empregada, portanto não há que se falar em entrega de boa-fé pelo legítimo possuidor, requisito essencial para a tipificação da conduta como apropriação indébita. Dessa forma, a coisa que pertencia à patroa (o troco) foi subtraída contra sua vontade, melhor ainda, sem seu conhecimento. Por consequência, não houve nem a dita inversão do animus do agente.

    O que acham?
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